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BC quer limitar o número de parcelas sem juros no cartão de crédito

O Banco Central tomou a frente da mediação nas negociações para regulamentar as operações no rotativo do cartão de crédito, e sinalizou que será necessário fazer uma limitação no parcelado sem juros. Em reunião ontem com representantes de 12 entidades da indústria de cartão, em São Paulo, o presidente do BC, Roberto Campos Neto, sugeriu um limite de 12 parcelas.

Hoje, não há um teto de parcelas para o pagamento sem juros nessa modalidade, o que é apontado pelos bancos como uma das razões para os juros altos e a elevada inadimplência nesse tipo de crédito.

O encontro de ontem terminou sem acordo. Uma nova reunião foi marcada para daqui a 15 dias, quando Campos

Neto prometeu apresentar números com base no limite de 12 parcelas sem juros, disse ao Estadão o presidente executivo da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel), Paulo Solmucci.

“O Roberto (Campos Neto) foi enfático ao dizer para confiar nele e que estava falando em 12 parcelas”, disse o dirigente da Abrasel. Ele foi um dos participantes da reunião que manifestaram preocupação com a sugestão apresentada no início do encontro pelo diretor de Organização do Sistema Financeiro e Resolução do BC, Renato Dias Gomes, de uma redução gradual do limite das parcelas – que sairiam de 15 para 12, depois para 9, até chegar a 6 vezes.

A regulamentação terá de ser validada pelo Conselho Monetário Nacional (CMN). Na fala final da reunião, o presidente do BC disse que, ocorrendo um avanço nas negociações, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, havia dito a ele que aceitaria votar a favor no CMN.

O impasse em torno de medidas para reduzir os juros altos do rotativo, que divide os diversos elos da cadeia do cartão de crédito, se arrasta há mais de seis meses. O debate se tornou mais urgente após o Congresso aprovar a Lei do Desenrola (programa de negociação de dívida) com um artigo dando um prazo de 90 dias para uma autorregulação do setor. Caso não haja a definição, a lei prevê um teto para os juros cobrados, que não poderão superar 100% do valor original da dívida.

O Estadão apurou que, na reunião, Campos Neto apelou para que todos pensassem no longo prazo e que cada um cedesse um pouco para a construção de um novo modelo.

A senha em torno de uma saída para limitação das parcelas foi dada ao mercado financeiro pelo diretor de Relacionamento, Cidadania e Supervisão de Conduta do Banco Central, Mauricio Moura. “O sistema de cartão de crédito precisa encontrar um novo equilíbrio, sem que nenhuma ponta seja prejudicada. É importante que todos os envolvidos do setor de cartões conversem”, disse Moura. •

COLABORARAM EDUARDO RODRIGUES/BRASÍLIA e MATHEUS

Modelo atual

Não há um limite hoje para as operações de pagamento sem juros no cartão de crédito

Contra o relógio

Caso não haja acordo sobre o limite do rotativo até o início de janeiro, teto da dívida será de 100%

Opresidente da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), Isaac Sidney, afirma que o Banco Central (BC) precisará arbitrar a regulação das operações do rotativo do cartão de crédito e do limite ao parcelado sem juros, após projeto de lei aprovado pelo Congresso dar prazo de 90 dias para uma autorregulação do setor.

Em entrevista ao Estadão, Isaac avaliou que a perpetuação do modelo atual de negócio não contará com o apoio da Febraban. “Somente emprestaremos nosso apoio a soluções que passem pela criação de limites ao parcelado das compras. Parcelado, sim, mas uma alavanca temerária para o superendividamento, não.”

O prazo do projeto de lei aprovado no Congresso termina no início de janeiro. Se não for apresentada uma proposta, será aplicado um teto que limita a dívida a 100% do montante original. Ou seja: o débito pode, no máximo, dobrar de tamanho. A seguir, os principais trechos da entrevista.

Como o sr. avalia o projeto aprovado pelo Congresso que trata de mudanças no crédito rotativo do cartão?

O texto original era muito preocupante e potencialmente danoso, porque simplesmente fixava um teto artificial de 8% ao mês, sem levar em conta a complexidade da indústria do cartão e peculiaridades que só existem no Brasil – onde 75% dos recebíveis não pagam um centavo de juros para os bancos emissores. A versão aprovada foi aprimorada e deve ser vista como uma oportunidade importante para aprofundarmos as causas do elevado spread bancário (diferença entre as taxas cobradas pelos bancos e as que eles pagam na captação de recursos).

E daqui para frente?

Caso não haja evolução, a lei prevê uma contenção dos juros cobrados, que não poderão superar o valor original da dívida. Mas se, ao final, a solução for apenas a de fixar um teto nos juros do rotativo, isso, além de não resolver a causa-raiz, vai manter os juros altos e pode limitar a oferta do produto.

O prazo de 90 dias para a regulação é tempo suficiente para se chegar a uma solução consensual?

Deveria ser suficiente. O BC precisará arbitrar uma solução. Apesar de o tema ser muito complexo, estamos confiantes de que a indústria de cartões, juntamente com o regulador (BC) eo governo, terá sucesso em promover evoluções materiais na dinâmica do cartão de crédito.

Com tantas posições divergentes, tudo indica que caberá ao BC fazer a regulamentação. O que acha disso?

Nunca vi o BC agir como mero espectador de temas sensíveis sobre o mercado de crédito. O BC será fundamental na coordenação e na mediação dos interesses diversos que envolvem toda a cadeia de cartões, que é complexa e tem modelos de negócios não só distintos, mas conflitantes. O BC tem mais do que condições, tem toda a autoridade legal, técnica e regulatória para arbitrar esse caminho. Se cada segmento da indústria de cartões apenas pensar no seu umbigo, sem ceder em nada, daqui a pouco estaremos, novamente, buscando atacar um problema que só tende a se agravar.

O que a Febraban defende em relação ao parcelado sem juros? Esse modelo é viável ainda?

Jamais advogamos o fim do parcelado sem juros. Parcelar crédito faz parte do nosso dia a dia.

Mas qual a avaliação da Febraban sobre o modelo do parcelado sem juros e o que pode mudar?

Somente emprestaremos o nosso apoio por soluções estruturais que passem pela criação de limites no parcelado das compras. Parcelado sem juros, sim, mas uma alavanca temerária para o superendividamento, não. Não dá para aceitar apenas teto de juros. É preciso termos a coragem e a transparência para dizer que o parcelado sem juros não é sem juros, pois os juros estão embutidos no preço do produto. O modelo atual gerou uma distorção e um desequilíbrio, no qual apenas um elo da cadeia tem ganhos – no caso, as maquininhas. E o comércio tem um custo grande para antecipar os recebíveis das vendas parceladas, pagando taxas de descontos altas e, no caso das maquininhas não vinculadas a bancos, chegam a cobrar de 70% a 130% ao ano de juros. A grande pergunta que tem de ser respondida é quem fica com as receitas dos juros embutidos no preço da mercadoria, já que o consumidor que parcela suas compras e paga em dia a fatura não paga um centavo de juros para o banco que emitiu o cartão.

O sr. está dizendo que os bancos não se beneficiam nessa cadeia, mesmo cobrando juros do rotativo, que anualizados chegariam a 450% ao ano?

Os bancos não cobram juros de 400% ao ano porque ninguém pode ficar mais de 30 dias no rotativo. Ou seja, ninguém fica 12 meses pagando esse patamar de juros. Os juros embutidos nas compras ditas “sem juros” estão em algum lugar, e é certo que não ficam no caixa dos bancos. Certo é que o comércio acaba embutindo no preço da mercadoria juros que o consumidor não vê na hora da compra. •

Autor/Veículo: O Estado de S.Paulo