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Brasil terá de investir em mais infraestrutura para diesel

O governo precisará, com senso de urgência, definir políticas públicas para reduzir a dependência do diesel, mas, ao mesmo tempo, dar sinais claros ao mercado para atrair novos investimentos em infraestrutura de importação e refino.

Na avaliação de especialistas, projetos de biocombustíveis, novas rotas tecnológicas do biorrefino e conversão de veículos pesados para gás natural e biometano são todos bem-vindos.

A substituição de parte do consumo de diesel, contudo, tem limites a curto e médio prazos e o país terá o desafio de buscar soluções para gargalos logísticos, para que não enfrente, ao fim da década, riscos de desabastecimento. Isso tudo no meio de uma transição energética — o que dificulta o planejamento energético.

De acordo com as projeções do Plano Nacional de Energia, da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), o Brasil precisará importar diesel até, pelo menos, 2050.

O país comprou, no exterior, o equivalente a 28% do consumo do combustível em 2022, segundo o Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE).

O CBIE prevê que, se não houver novos projetos de refino no país, para além do segundo trem da Refinaria Abreu e Lima (Rnest), em Pernambuco, haverá déficit na capacidade de abastecimento do mercado a partir de 2029 — seja por meio da produção doméstica, seja por meio de importações.

“Se a economia se comportar de acordo com as expectativas do governo, vai haver um buraco [entre oferta e demanda]. Para construir uma refinaria, são necessários de quatro a seis anos, então o momento para se preocupar com isso é agora”, diz o diretor do CBIE Bruno Pascon.

Governo sinaliza para aumento da capacidade de refino

O governo Lula tem sinalizado a intenção de ampliar a capacidade de refino nacional, dentro de uma pauta de substituição de importações.

Em março, o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) orientou a Pré-Sal Petróleo S.A. (PPSA), responsável pela comercialização do óleo da União nos contratos de partilha, a apresentar, em 180 dias, estudos sobre viabilidade técnica e econômica de mecanismos para priorizar o abastecimento nacional de combustíveis.

O governo pretende direcionar, assim, o óleo que cabe à União nos contratos de partilha para o refino nacional. Atualmente, todo o petróleo da União é vendido em sua forma bruta, em leilões.

Embora a Petrobras tenha contratado a maior parte dos volumes leiloados pela PPSA, não há garantias, hoje, de que esses barris tenham como destino o mercado doméstico.

O objetivo, segundo o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, é agregar valor ao petróleo da União por meio da venda de produtos refinados e fortalecer o mercado nacional.

“Queremos que o petróleo e o gás natural da União, provenientes dos contratos de partilha de produção, promovam a industrialização do Brasil e garantam a segurança no abastecimento nacional de energia, insumos petrolíferos, dos fertilizantes nitrogenados e de outros produtos químicos, reduzindo a dependência externa, e valorizando o conteúdo local. As nossas empresas precisam priorizar o abastecimento nacional. É isso que vamos buscar”, afirmou Silveira, ao anunciar as novas diretrizes do CNPE.

Para o ex-presidente da Petrobras e pesquisador do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep), Sérgio Gabrielli, o país vai precisar ampliar a capacidade de refino mesmo com a chegada de fontes alternativas aos fósseis.

“É muito difícil imaginar que até 2050 vai haver uma mudança substantiva da frota de veículos. Vamos ter por muito tempo ainda demanda por veículos a combustão, portanto vai haver demanda por combustíveis fósseis para o transporte”, diz.

Gabrielli lembra que a capacidade de hidrotratamento para produção de diesel no país está no limite. Além disso, explica, o próprio crescimento do biorrefino compete com a capacidade de produção de diesel nas refinarias — e, portanto, também tem limites de expansão.

Por isso, ele defende que é necessário que o país construa pelo menos uma nova refinaria, com capacidade para 500 mil barris/dia para entrar em operação até 2028, preferencialmente no Nordeste — região hoje que mais depende de importações.

Um desafio adicional para o parque de refino atual é a substituição do diesel S500 pelo S10, menos poluente, mas que também encontra limitações técnicas nas refinarias.

Os limites dos biocombustíveis

Reduzir a dependência das importações de biodiesel apenas por meio dos biocombustíveis é visto com ceticismo pelo sócio da Leggio Consultoria, Marcus D’Elia, por causa dos limites técnicos e econômicos para a expansão do biodiesel na matriz.

“O biocombustível não resolve o problema da importação”, diz

Hoje, a mistura obrigatória do biodiesel ao diesel é de 12%. Esse percentual vai aumentar gradualmente até chegar a 16% em 2026, de acordo com cronograma definido pelo CNPE.

Ampliações ainda maiores na mistura obrigatória afetam o desempenho dos motores e encarecem o diesel, alegam diferentes elos da cadeia — como transportadores (CNT), distribuidoras (Brasilcom), indústria de máquinas (Abimaq), montadoras (Anfavea), postos (Fecombustíveis) e importadores de combustíveis (Abicom).

Os produtores Abiove (óleos vegetais), Aprobio e Ubrabio (biodiesel) rebatem:

Os críticos ao biodiesel defendem que mandatos maiores de biocombustíveis se deem por meio de novas rotas tecnológicas e que ainda carecem de regulamentação no país, como o diesel renovável.

Mesmo num cenário em que o mandato dos biocombustíveis chegue a 20%, com a inserção de novas rotas tecnológicas, há desafios para aumentar o esmagamento de soja — matéria-prima para produção tanto de biodiesel quanto diesel renovável.

O problema, nesse caso, diz D’Elia, é que não existe equilíbrio econômico para ampliar o esmagamento de soja, em detrimento da exportação.

Gaseificação da frota desponta como opção

Para além dos biocombustíveis, uma das alternativas em debate para reduzir a dependência por importações de diesel é a ampliação do uso do gás natural (e biometano) na frota — além da disseminação de motores elétricos e híbridos.

“Mas estamos falando de 15 anos para começar a ter resultados significativos, porque a frota brasileira é muito grande e o tempo de renovação é longo”, argumenta D’Elia.

A eletrificação e a adoção de medidas para maior eficiência energética também são alternativas para gerenciar a demanda interna de diesel, na visão da diretora de dowstream do Instituto Brasileiro do Petróleo (IBP), Valéria Lima.

“Mas não temos uma solução dominante para o diesel marítimo, por exemplo, na transição energética”, ressalva.

Lima relativiza, contudo, a dependência das importações como um problema.

“Trocar com o exterior nos coloca numa situação privilegiada para enfrentar eventuais crises, pois estabelece fluxos confiáveis de comércio. Ter que ir ao mercado externo apenas no momento de crise é o pior cenário”, diz.

Infraestrutura precisa ser ampliada

O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, tem defendido que o país precisa reduzir a dependência externa do diesel.

D’Elia, da Leggio, afirma que a ampliação da infraestrutura para movimentação portuária de combustíveis é uma necessidade, independente da redução da dependência das importações, uma vez que a movimentação interna das cargas também ocorrerá pelos portos.

Um estudo da Leggio junto com o Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP) mostra que o país vai demandar R$ 118 bilhões em investimentos em infraestrutura logística e de distribuição para para atender ao crescimento da demanda por biocombustíveis até 2035 — incluindo, na conta, o etanol para os veículos leves.

O IBP ressalta a necessidade de atenção sobretudo à infraestrutura de internalização dos combustíveis no país, o que inclui dutos e ferrovias.

Parte da necessidade de infraestrutura passa também pelo aumento da tancagem.

Gabrielli acredita, no entanto, que os investimentos em armazenagem sofrem com a alta variação de margem e ficam prejudicados num ambiente de altas taxas de juros.

Uma transição energética no meio do caminho
Além disso, esses novos investimentos precisam, desde a concepção, levar em conta a conversão para atuar com fontes de menos emissões no futuro.

Uma alternativa, por exemplo, é usar a tancagem de diesel no futuro para armazenagem de combustíveis marítimos menos emissores ou para exportação de diesel renovável.

O Brasil vive o desafio de ampliar a infraestrutura para atender à demanda fóssil num momento em que o mundo busca se afastar desses combustíveis.

“O tempo para amortizar o investimento em uma grande refinaria, de mais de 200 mil barris/dia, é de 35 anos. Pode até haver vontade política para isso, mas é difícil achar o financiamento”, diz D’Elia.

O presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, já afastou a possibilidade de a companhia construir grandes projetos de refinarias, as quais chamou de “mastodontes”.

“A transição energética leva a pensar que o consumo reduzirá nessa curva do tempo. Se a gente colocar uma refinaria hoje, nova de 300 [mil], 400 mil barris de capacidade, terá uma vida útil de quinze anos, não se paga”, afirmou Prates em entrevista à Miriam Leitão, em março. Há uma dificuldade de se imaginar um mastodonte desses hoje em dia. O aumento da capacidade de refino está dentro das atuais refinarias”, completou.

Em artigo recente, Prates defendeu que a companhia deve “aplicar a experiência e a excelência técnica da Petrobras no desenvolvimento de bioprodutos. E citou os planos da Petrobras para converter as unidades de refino em “bio-petro-gás refinarias”, onde a empresa processará “combustíveis de nova geração”.

Pascon, do CBIE, lembra que 2022 foi o primeiro ano em que não houve aumento na capacidade de refino global. Isso influenciou, inclusive, as margens do setor (o crack spread), que subiram e impactaram os custos dos combustíveis.

“A demanda continua alta. Se não houver novos investimentos, os produtos vão continuar a encarecer, o mundo todo está precisando de mais capacidade de refino. A pergunta é quem vai fazer esse investimento. A China, por exemplo, tem grandes planos nesse sentido”, afirma.

Fonte: EPBR