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Inflação de serviços sobe e põe pressão para BC adiar corte do juro

Impulsionados pelo aumento da demanda e pelo repasse de custos, ambos reprimidos no auge da pandemia, os preços no setor de serviços deram um salto neste início de ano. Isso acende o sinal de alerta e coloca mais pressão sobre o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central para adiar o corte nos juros.

Em fevereiro, a inflação de serviços descolou do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), de 0,84%, e subiu 1,41%. A alta foi mais do que o dobro da de janeiro (0,6%) e a maior marca mensal em quase 20 anos. Só ficou abaixo da inflação de serviços de fevereiro de 2004 (1,57%), aponta a LCA Consultores, com base no IPCA do IBGE. Em 12 meses até fevereiro, os preços dos serviços subiram 7,84% e superaram a inflação do período, de 5,6%.

No mês passado, de 28 itens não alimentícios do IPCA que tiveram os maiores reajustes de preços, mais da metade (18) foi serviços. O destaque ficou com a educação: o reajuste de 6,4%, em média, em fevereiro, superou o de anos anteriores.

Pacotes turísticos, com alta de 2,09% em fevereiro, costureira (1,42%), consulta médica (1,39%), aluguéis residenciais (0,88%), manicure, cabeleireiro e barbeiro (0,71%) também chamaram a atenção.

No caso dos aluguéis, há um componente extra. Com a elevação da taxa de juros dos financiamentos imobiliários, que beiram 11% ao ano, influenciada pelo juro básico (Selic), a compra da casa própria deve ficar mais difícil, observa o economista Fabio Romão, da LCA Consultores. O resultado foi o aumento da procura por locação e a pressão nos aluguéis. Em 12 meses até fevereiro, os aluguéis residenciais subiram 6,94%.

MÃO DE OBRA. Outro fator que tem se refletido nos preços dos serviços é o aumento do custo da mão de obra, especialmente por conta da sinalização do reajuste do salário mínimo acima da inflação, observa o economista da LCA.

O engenheiro mecânico aposentado Claudio Florio, há 12 anos dono de um ateliê de costura, o Fix Atelier, aplica seus conhecimentos da engenharia para calcular custos e preços em sua oficina. Dos 220 serviços de costura prestados, a mão de obra representa quase a metade do custo.

Depois de quase dois anos sem reajuste, o empresário aplicou um aumento de 12% nos preços em abril passado e mais 10% no fim do ano. Nas suas

“A pulga atrás da orelha do Banco Central e dos analistas é se realmente os serviços vão desacelerar e em qual ritmo”

Fabio Romão

Economista da LCA

“(A elevação da inflação de serviços é) uma arrumação da casa no pós-pandemia”

Guilherme Moreira

Coordenador do IPC da Fipe

contas, teria ainda de fazer um de 6%, mas evitou, porque o volume de trabalho cresceu tanto que compensou a defasagem. “A demanda está bem aquecida, 20% acima da de 2019, antes da pandemia”, diz.

O tempo de espera para a conclusão do serviço na oficina é de uma semana, enquanto o normal seria de três dias. Ele conta que chega a perder R$ 400 de serviço por dia por não conseguir contratar costureiras com o padrão desejado.

Na avaliação do economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale, a pressão de gastos públicos sinalizada pelo governo também deve turbinar os preços do setor. “Estamos voltando para os tempos de Lula 2 e Dilma em que a inflação de serviços vivia permanentemente elevada, muito em parte pela pressão salarial criada pelo próprio governo, seja via servidores, seja via salário mínimo.” Para este ano, o economista espera que a inflação de serviços atinja 6,5%, ante um IPCA cheio projetado de 6%.

Já o economista Guilherme Moreira, coordenador do Índice de Preços ao Consumidor (IPC) da Fipe, está mais preocupado com a inflação de alimentos. De janeiro de 2020 a fevereiro deste ano, a alimentação no domicílio pelo IPC da Fipe subiu 47,59%, quase o dobro da inflação geral acumulada no mesmo período (25,7%). Os preços dos alimentos não vão cair 47% daqui para frente e a renda tirada das pessoas não deve voltar, alerta. Por isso, diz Moreira, o processo de inflação no Brasil é complicado. “Se fosse só uma inflação de serviços, seria mais fácil controlar.” •

O Banco Central vem sofrendo grande pressão do governo e de alguns setores da economia para começar a reduzir a taxa Selic, hoje em 13,75% ao ano. Mas, pelo menos para a reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) que se iniciou ontem e se encerra hoje, a taxa deve permanecer como está, na visão dos analistas do mercado financeiro.

Essa projeção foi unânime entre as 45 instituições ouvidas pelo Projeções Broadcast. Além disso, a maior parte delas (24) projeta o início dos cortes no segundo semestre; seis, ainda neste primeiro semestre; e outras 15, só em 2024. A mediana de todas as projeções aponta que a Selic deve terminar este ano em 12,5%, chegando a 10,25%, no fim de 2024, e a 9% em 2025.

Carlos Lopes, economista do Banco BV, projeta o início dos cortes da Selic no terceiro trimestre, levando o juro a 12% no fim do ano. Para ele, o cenário de inflação atual não permite que o Copom comece – ou mesmo sinalize – reduções nas duas próximas reuniões.

“Os núcleos (de inflação) seguem altos, com destaque para a inflação de serviços. Apesar da desaceleração do crédito, o mercado de trabalho ainda aquecido e o crescimento da renda têm ajudado a sustentar esses preços”, diz. Para Lopes, a perspectiva inflacionária poderia inclusive postergar o início dos cortes, mas a incerteza com o sistema bancário no exterior “equilibrou” esse risco.

Ele pondera que a crise dos bancos ainda está no início e que seria arriscado o BC alterar sua estratégia em cima de algo que não se caracterizou, por enquanto, como um problema para a atividade econômica. O tema, porém, deve ser reconhecido nas próximas comunicações da autarquia, avalia Lopes.

Para o economista, a proposta de nova âncora fiscal tampouco deve trazer conforto para o BC. “Independentemente do desenho, a sinalização do governo é de crescimento real das despesas, ao menos no curto prazo”, diz Lopes, que ressalta que o arcabouço precisará ainda ser “digerido” no Congresso, o que torna incerto o que efetivamente será aprovado. ‘ATRASADO’. O economistachefe do Banco Original, Marco Caruso, manteve a expectativa de redução da Selic a partir do quarto trimestre, para 13% no fim de 2023. Apesar do aperto nas condições de crédito com a crise da Americanas e da incerteza em torno do sistema bancário internacional, ele argumenta que não há evidências de “credit crunch” (a diminuição drástica na oferta de crédito) no Brasil. “Vejo um encarecimento natural do crédito para pessoa jurídica e um aumento do spread para alguns patamares altos, mas, sinceramente, acho que é natural e esperado que o crédito responda à subida da Selic, foi até um pouco atrasado”, diz.

O economista-chefe da Quantitas, Ivo Chermont, espera início dos cortes da Selic só em janeiro de 2024. “A inflação não está cedendo, o PIB está meio ‘paradão’ e as expectativas estão piorando. Não se veem motivos para uma queda dos juros ao longo deste ano”, argumenta.

Fonte: O Estado de S.Paulo